O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começa a julgar nesta terça-feira (26), às 19 horas, duas ações do PT que pedem a cassação do mandato do presidente Jair Bolsonaro e do vice, Hamilton Mourão.
A acusação é de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação na campanha eleitoral de 2018, pelo suposto disparo de mensagens em massa contendo notícias falsas contra o então candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad.
O julgamento pode se estender e continuar na sessão de quinta-feira (28) e a tendência, segundo apurou a Gazeta do Povo, é que não haja condenação por falta de provas.
Apesar disso, os ministros devem aproveitar para passar recados em seus votos, dizendo que usar o WhatsApp e as redes sociais para disseminar ataques a adversários, de forma massiva por meio de robôs, é um ilícito que não pode ser admitido na disputa. O objetivo é deixar claro que, se isso acontecer nas eleições de 2022, não haverá tolerância.
Em relação a 2018, a avaliação entre os ministros é que não há comprovação de que isso tenha ocorrido na campanha de Bolsonaro e, muito menos, que tenha contribuído decisivamente para vitória dele, uma das condições para a destituição do mandato.
Em março deste ano, duas ações muito semelhantes, apresentadas pelo PDT, foram julgadas improcedentes pelo mesmos motivos. Por unanimidade, os sete ministros da Corte eleitoral consideraram que as acusações baseavam-se em "suposições" que não tinham como ser comprovadas.
"Acusação amparada em meras conjecturas. Inexiste nos autos qualquer elemento que demonstre, mesmo de forma inicial, a ocorrência de compra de base de dados de terceiros ou que evidencie que pessoas não inscritas para receber notícias da campanha de Jair Bolsonaro tenham sido alvo dos disparos em massa", diz o acórdão da decisão.
Todas as quatro ações — as duas do PDT, já arquivadas, e as duas do PT, a serem julgadas — foram apresentadas ainda em 2018, com base em reportagens do jornal Folha de S.Paulo, que apontou a existência de um suposto esquema, que seria financiado por empresários, para espalhar "fake news" com objetivo de manchar a imagem do PT e de Haddad. Para isso, eles teriam contratado empresas especializadas para disparar esse conteúdo, usando chips de celular cadastrados em nome de idosos.
Em todos os processos, nunca foi apresentado um exemplo desse tipo de mensagem, nem identificados pagamentos de empresários por esses serviços em favor de Bolsonaro. "O conjunto probatório produzido descortinou-se deveras frágil, não tendo a coligação representante trazido aos autos uma única prova da existência das mensagens com conteúdo falso. A autora também não foi capaz de demonstrar, sequer de forma inicial, a existência de relação jurídica entre a campanha de Jair Bolsonaro ou apoiadores desse último e as empresas de publicidade que teriam realizado os disparos em massa", afirmou ainda o acórdão do julgamento de março.
De lá para cá, a novidade mais importante foi a decisão do ministro Alexandre de Moraes de compartilhar o material que coletou nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos, abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar ofensas aos integrantes da Corte.
Os documentos chegaram em setembro e referiam-se, em sua maior parte, a relatórios da Polícia Federal que descrevem e reproduzem trocas de mensagens entre militantes e apoiadores de Bolsonaro, entre 2019 e 2020, para organizar manifestações de rua a favor do governo. Não foram encontrados, porém, provas relacionadas ao disparo de mensagens no período eleitoral de 2018.
Em parecer enviado ao TSE, em favor do arquivamento das ações, o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, apontou "dissonância cronológica entre os fatos apurados no STF e os momentos relevantes para o objeto das ações em curso no TSE".
Investigações do TSE apontaram apenas folhetos em favor da chapa
A única prova encontrada relacionada à eleição de 2018 foram orçamentos e notas fiscais da compra de 560 mil panfletos e adesivos a favor de Bolsonaro. Eles foram pagos pelo empresário Otávio Fakhoury, próximo da família de Bolsonaro. A defesa do presidente, no entanto, afirmou que tratou-se de um apoio autônomo e sem ligação com a campanha oficial e sem qualquer relação com o objeto das ações.
Outras decisões do TSE isentaram o presidente de qualquer responsabilidade por propagandas independentes feitas em seu favor, por exemplo, por meio do pagamento espontâneo de outdoors por parte de apoiadores em diversas cidades.
A falta de provas contundentes no processo, mesmo no material enviado pelo STF, levou o próprio PT a pedir, ainda neste mês de outubro, a reabertura da fase de coleta de provas. O partido queria quebras de sigilo e tomada de depoimentos de mais testemunhas. O corregedor-geral da Justiça Eleitoral e relator das ações, Luís Felipe Salomão, negou o pedido e encerrou a instrução do processo. Entre ministros do tribunal, a avaliação é que é preciso dar um "ponto final" nesse caso que, para muitos deles, se arrastou além do razoável. Salomão, aliás, encerra seu mandato no TSE na próxima sexta-feira (29) e quer encerrar as ações antes de sua saída do tribunal.
Outro ponto importante que deve ser ressaltado pelos ministros, e que já foi indicado no julgamento das duas primeiras ações, é a necessidade de que, numa ação de cassação de mandato, se demonstre que uma eventual irregularidade na campanha tenha causado um desequilíbrio tão grave na disputa que deslegitime o resultado. Trata-se de um requisito fundamental nesse tipo de ação, sobretudo porque uma cassação de mandato pela Justiça Eleitoral representa uma decisão que anula uma escolha popular composta pelo voto de milhões de eleitores.
"Inexistente demonstração efetiva da materialidade do ilícito e de sua gravidade, não há que se perquirir acerca de eventuais reflexos eleitorais. Não sendo possível constatar a prática de conduta grave o suficiente para turbar a legitimidade, a normalidade e a paridade de armas das eleições, fica afastada a ocorrência do abuso de poder, o que, por sua vez, conduz à rejeição dos pedidos de cassação do mandato e declaração de inelegibilidade", diz o acórdão do julgamento das ações do PDT, redigido por Luís Felipe Salomão.
Gazeta do Povo